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“Babel”: uma verdadeira decepção.

Janeiro 20, 2007

Também, com um título destes, o que se poderia esperar? A história da Babilônia? Ou da mítica Torre de Babel, construída para ser um verdadeiro caminho aos céus? Desde a história da torre, os deuses mostraram que a arrogância do homem não passou impune e a destruiram. E tampouco deve passar incólume o pretencioso filme Babel, do diretor mexicano Alejandro Iñárritu.

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Não há como negar que a atuação dos atores é excelente, ainda que os elogios ao Brad Pitt pós-angelina sejam desproporcionais. Impressionante, realmente, foi a atuação da atriz japonesa Rinko Kikuchi.  A fotografia também merece crédito: o deserto de Marrocos com suas  ‘excentricidades’ foram bem retratados; os arranhacéus, a loucura e os barulhos ensurdecedores da megalópolis Tóquio, estão todos, devidamente, presentes. Não há, tampouco, o que se possa criticar das cenas mexicanas. A não ser, talvez, uma previsibilidade irritante.

As quatro complexas tramas, ‘magicamente’, se entrelaçam e, como quase todo filme pseudo-intelectual, é claro que tudo fica no ar, porque, afinal de contas, tudo sempre “tem” que ficar no ar, no mundo.  As perguntas ficam sem respostas e os conflitos são expostos por si só. Pela simples — ó céus! — beleza de existirem. Então é o seguinte: no meio do deserto marroquino, numa brincadeira com o irmão, um menino dispara uma bala que atinge uma turista americana, detonando uma crise internacional. Enquanto isso, na América, a babá mexicana acaba por levar os filhos do casal americano para o casamento do filho no México. No outro lado do globo, no Japão, conhecemos o mundinho silencioso de uma teenager surda-muda, cujo pai havia ofertado o rifle para o seu guia no Marrocos. E o filme é narrado num vai-e-vem entre os continentes. Alternando línguas, músicas e paisagens. Acontece que há muito mais em cada trama. Acontece que, desculpem-me se sou muito crítica, mas cada uma delas daria um filme.  Iñaárritu, diretor dos excelentes Amores Perros e 21 gramas parece ter esquecido que um bom filme é sempre resultado de uma história bem narrada, que, geralmente, se desenvolve a partir de um conflito apenas, para criar um universo complexo a partir daí. É por isso, por exemplo, que Crash, para lembrar de um exemplo fresco na memória, é um filme fenomenal. Ele gira em torno de um conflito e dá conta de um tema cuja complexidade não poderia ser dividida com outros temas. Crash, usa de uma forma narrativa clássica, da mesma forma que as mais belas e complexas composições musicais possuem variações criativas sobre um tema.

Ora, Babel quer fazer tudo ao mesmo tempo: falar sobre conflitos entre casais; sobre a paranóia do nosso mundo com o terrorismo; sobre a complexa relação de uma filha surda-muda com o pai; sobre crescer sem a figura materna; sobre a absurda política de imigração estadunidense. E mais, senão não faço juz à ‘complexidade’ do filme,  Babel promove a idéia lugar-comum que no nosso mundo pós-moderno, ultra globalizado, ninguém se entende, que todos somos limitados e falíveis (como se esse não fosse um dos temas mais recorrentes da história da humanidade desde os primórdios dos tempos…). Que, a despeito de línguas, paisagens, músicas e roupas diferentes, somos todos, “iguais”…

Sabem o quê? Eu acho que Babel fala com excessiva pretensão. Quem pretende muito, faz pouco. E eu fico, então, como uma voz isolada aqui? A criticar o filme que está recebendo todos os louros? O favorito para o Oscar? Repito, não há nada, mas absolutamente nada, como uma “bela história bem narrada”. É óbvio que isso não significa filmes hollywoodianos simplóides e clonados onde tudo acaba bem. Ou que tem que ter começo-meio-fim, em linearidades artificiais. Um filme tem que ser algo esteticamente “orgânico”. Essa função essencial da narrativa cinematográfica parece ter sido definitivamente ignorada em Babel.