Estão vendo o mini amor-perfeito do canto da foto? Ele apareceu inesperadamente, do nada. Quer dizer, na realidade, não foi ‘do nada’, pois nada vem do nada, como já dizia o Bardo. Ele ficou quase um ano dormente, sobreviveu faceiro o inverno do ano passado, passou incólume a primavera, mas, sobretudo, enfrentou as temperaturas inclementes de um verão atipicamente quente e seco. Não bastasse isso, suportou o manuseio de uma tal metida a ‘jardineira’, que mexe e remexe em seus canteiros. E vocês acham que isso é pouco para um singelo amor-perfeito? Nada disso, vitorioso ele!
Os amores-perfeitos (pansies em inglês, que vêem do francês pensés, que significa pensamentos) gostam do inverno e florescem abundantemente no sul do Brasil em texturas aveludadas e cores absurdamente intensas: o roxo é roxo, o amarelo é amarelo. Eles não economizam nas cores. Há duas variedades: os amores-perfeitos de tamanho normal e os mini amores-perfeitos, que são um mimo. Eles são muito mais resistentes que as violetas, que são florzinhas ‘de lua’, isto é, são inconstantes, de modo que você não deve confiar muito na sua beleza efêmera.
Hoje removi os cravos que não suportam o frio e já deram o que tinham que dar; fico a eles muito agradecida. Por duas vezes travei guerra contra as formigas carregadeiras, que, em questão de dias, dão cabo de um canteiro grande. As formigas adoram as pétalas de perfume adocicado dos cravos. De qualquer maneira, a maioria das flores já havia secado e o aspecto do canteiro estava um tanto quanto negligenciado. Então, mãos à obra: foram-se os cravos e ficam, como sempre, as lindas lavandas, as confiáveis allisons (flores de mel) e alguns alecrins, que garantem o perfume. As lavandas, não canso de repetir, são a alegria do jardim (que as outras flores não me escutem, porque planta ciumenta é fogo!), suportam o calor, a seca, o frio e até o mau-jeito de jardineiras metidas. Só sinto muito falta das minhas rosas. Mas não é nada que não possa ser remediado logo.
O meu canteiro há três semanas, quando o clima estava ameno. Hoje ele está sem os cravos, aguardando novas mudas.
O legal do jardim é isso: é a lida com a terra. É, antes de se encantar com a beleza das flores, entender como elas funcionam e se elas servem para o seu jardim e para você. É planejar o canteiro e tentar visualizar e harmonizar as cores, tamanhos e plantas. É preparar a terra, plantar com o espaçamento adequado, regar as pequenas mudinhas nas doses certas, extirpar as ervas daninhas que comprometem o crescimento das plantas. É um cultivar gostoso e constante: não dá para esquecer o canteiro de todo, pois, lembrem que nem todas as plantas possuem a invejável independência da lavanda. Depois, é ter prazer de vê-las crescendo, até que as pequenas ou grandes flores dêem o ar de suas graças. E graciosas elas se revelam em cores, formatos, tamanhos e fragâncias tão diversos quanto fascinantes. É uma descoberta constante.
Esse é um dos meus hobbies favoritos e é uma das minhas principais justificativas para morar numa casa (o meu marido tem outra que é imbativel!). Alguns diriam que é um cuidado a mais, que é besteira, que pode-se admirar as flores nos parques, em jardins botânicos e nos jardins de outras pessoas – na região onde eu moro, felizmente, não faltam flores. É verdade. Outras pessoas podem pensar que é falta do que fazer. Hehe: não têm idéia do que seja a minha vida… É que eu amo o meu jardim. E amo cultivar o meu jardim.
There is rosemary, that’s for remembrance:
and there is pansies, that’s for thoughts.
(Ofélia na cena de distribuição de flores em Hamlet)