“A terra devastada”: os efeitos do aquecimento global na literatura.

Janeiro 13, 2007

Atenção: Este texto é parte de uma pesquisa que estou desenvolvendo. Se você quiser reproduzir, citar ou usar partes do meu texto, entre em contato comigo via email: crisbs@superig.com.br . Obrigada.

(Convite irrecusável da Alline, escrevo este post para a campanha “Adote o seu planeta”, promovida por Allan, do blog  cartadaitalia e Lúcia Malla, do umamallapelomundo.)

“A terra devastada” (“The Wasteland”) de T. S. Elliot é um dos grandes poemas do século XX. Escrito em 1922, ele descreve um mundo fragmentado, onde o homem se depara com seu próprio esvaziamento e deterioração.  A natureza, tal qual Elliot a concebe, serve de metáfora para a condição humana, uma árida e desértica ilha cercada de um oceano de nadas. A expressão “the wasteland” (terra devastada), desde então, é usada também para se referir a essa condição triste e insólita.

Os escritores sempre escreveram a terra das mais diversas formas e para os mais diversos fins.  A literatura, tal qual a pintura, é fundamental na função de descrever e, consequentemente, registrar a fauna e a flora dos países sobre os quais os autores escreviam. Consiste, então, em documentação importante para cientistas e interessados, sobretudo quando levamos em conta que a fotografia somente apareceu na metade do  século XIX.

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Grosso modo, desde a emergência dos Estudos Culturais, na década de setenta, não se estuda a literatura apenas para encontrar a estética nos textos. Críticos e estudiosos da literatura se preocupam com as ideologias que perpassam o texto literário. Diferentes teorias literárias examinam as relações entre escritores, textos e o mundo. Nos estudos femininos (ou feministas), pergunta-se, por exemplo, como a mulher é descrita na literatura? Por quem ela é descrita? Por que ela, invariavelmente, figura como musa inatingível ou perigosa sedutora? Por que ela quase sempre aparece no âmbito privado, “fora” do âmbito público? São, essas construções do feminino, espelhos que refletem a realidade da mulher? Que problemas encontramos nessas representações?

Voltemos agora à questão inicial. Desde o final da década de oitenta e, mais marcadamente a partir da década de noventa, criou-se uma nova, digamos “categoria”, na crítica literária denominada “ecocrítica“. A ecocrítica expande a relação escritor – texto – mundo, quando considera que o “mundo” não se refere somente à sociedade mas envolve, também, o ecosistema em sua totalidade.  Como dizem Chery Glotfelty e Harold Fromm, se aceitamos que tudo está interconectado, “devemos concluir que a literatura não flutua acima do mundo material como um éter estético; ao contrário, ela tem um papel importante neste imenso e complexo sistema global, no qual, a energia, a matéria e as idéias interagem” (The Ecocriticism Reader, minha tradução)  

E, de fato, a ecocrítica encontrou adeptos fervorosos, pessoas que se dedicam a questionar assuntos fundamentais para o nosso querido e valioso mundinho. Por exemplo, numa aula de literatura a pergunta chavão “como o meio-ambiente reflete a personagem / o enrêdo, etc.?”, se desdobra em “como as metáforas do meio ambiente influenciam o modo que percebemos e tratamos o meio-ambiente?”. Dessa ótica, as perguntas se tornam tão variadas quanto interessantes: “De que maneira a literariedade afeta a relação do homem com o meio-ambiente?”; “Como a literatura registra a devastação ecológica que países como o Canadá, Nova Zelândia, Brasil, Austrália, etc. sofreram com a chegada do europeu no “Novo Mundo”?

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São, ao meu ver, perguntas fundamentais, uma vez que dirigem as nossas atenções para assuntos que devem ser pensados. Um dos principais motivos de termos negligenciado o nosso meio-ambiente é auma absurda falta de ética. Superar essa crise, como sugere Al Gore em Uma verdade inconveniente, requer não somente um entendimento científico de como nossos ecossistemas funcionam, mas, sobretudo,  uma verdadeira reforma ética, de conduta mesmo. A ecocrítica não vai salvar o nosso meio ambiente, é claro. Mas pode ajudar.

Para concluir, fico imaginando que textos Hemingway escreveria hoje em dia. As neves de Kilimanjaro já não exerceriam o mesmo impacto porque elas sequer existem… Green hills of Africa, seriam tão “green”? O belo romance O velho e o mar, que concedeu o prêmio nobel de literatura para Hemingway, teria sido escrito da mesma forma? Pois hoje seria muito difícil pescar um merlin do mesmo porte no Golfo do México, imagino…  Joseph Conrad seria o mesmo Joseph Conrad que eu leio nas aventuras de seus personagens na África? E a Austrália que eu li, em “primeira mão”, através das penas dos primeiros diários e cartas das esposas dos colonizadores, é a Austrália de hoje? E a nossa “Canção de Exílio” de Gonçalves Dias, exemplo maior do ufanismo de nossa terra brasilis, como fica? (Minha terra tem palmeiras, / Onde canta o Sabiá; /As aves, que aqui gorjeiam, / Não gorjeiam como lá, etc.)

Parece que a resposta Mário Quintana nos dá, em Canção. Um pequeno, porém eficaz protesto ecológico sobre a nossa “terra devastada”:

Minha terra não tem palmeiras…
E em vez de um mero sabiá,
Cantam aves invisíveis
Nas palmeiras que não há.

global-warming2.pngTemperatura: 37oC, na sombra. Um verão com temperaturas atipicamente altas. Lat: S25o 24′ 06”   Lon: W 49o  17′ 15” 

24 Respostas to ““A terra devastada”: os efeitos do aquecimento global na literatura.”

  1. JN Says:

    De facto dá o que pensar…
    Gostei muito do post!

  2. cris s Says:

    JN,
    Obrigada!! Vou já tomar um cafézinho no notas ao café.

  3. Alline Says:

    Cris, eu amei seu post e o seu “ponto de vista literário” sobre o tema.
    Excelente mesmo.
    Beijo grande

  4. cris s Says:

    Alline,
    Que bom que você gostou! Obrigada pela motivação.
    Beijão,
    Cris

  5. Allan Says:

    Cris,
    O texto está muito bom.
    Também acho que a ecocrítica não irá salvar o planeta, mas obriga as pessoas a pensar. O que pode salvar o mundo é um novo modelo econômico, é cada um fazer a sua parte.
    🙂

  6. cris s Says:

    Allan,
    Legal você ter gostado.
    Se cada um fizer a sua parte, MUITA coisa pode mudar. A ecocrítica tem angariado muita atenção no meio dos Estudos Culturais. Pena que é assunto desconhecido da maioria dos professores de literatura no Brasil. 😦 Discutir essas questões na sala de aula pode parecer uma medida irrisória, mas faz a meninada pensar. Até para o professor é bom, pois ele tem que preparar a aula e ter um conhecimento pelo menos básico do assunto. Eu gosto de dar relatos de viajantes como Frei Bartolomé de las Casas e do Cabeza de Vaca, ambos descrevem a terra e o genocídio horroso da colonização na América. Parabéns pela iniciativa.
    Cris

  7. Lucia Malla Says:

    Cris, gostei muito da sua abordagem. Quero sugerir q poste tbm no “Faça a sua parte” esse texto, para q as pessoas q lá chegam possam tbm ler essa visão crítica e nostálgica do ambiente. Ecocrítica e reforma ética são definitivamente o q precisamos no momento. Beijos.

  8. cris s Says:

    Lúcia,
    Obrigada! Fico muito feliz que você tenha gostado e claro, vou postar o texto no “Faça a sua parte”. Como faço p/ postar lá? 🙂
    Concordo que a ecocrítica possa efetivamente ajudar. Tem muita coisa boa já publicada sobre o assunto e disciplinas interessantes ofertadas nos Departamentos de Letras, principalmente na Inglaterra e Estados Unidos.
    beijo e obrigada pela visita!!
    Cris

  9. Lucia Malla Says:

    Cris, se vc quiser ser colaboradora contínua lá, é só levantar o dedo! 🙂

    Mas se quiser q só esse texto entre, eu posso colar lá para vc. Vc decide o q vc prefere.

    Beijo.

  10. cris s Says:

    Lucia,
    Hehe, vocês dão conta da tarefa BEM melhor!! Se você puder colar o texto, eu agradeço. Ou, se preferir, posso enviar p/ o teu email c/ as imagens (não sei se vcs acham legal inserir as imagens, também).
    Bjs,
    Cris

  11. Lucia Malla Says:

    Mande pro meu email, Cris, fica mais fácil. As imagens fazem parte, se vc não se importa. Acho q elas dão vida ao texto. 🙂

  12. cris s Says:

    Lucia,
    Envio p/ o teu email amanhã. Vou tentar colar as imagens no texto (já notou a “competência”, hehe). Vc avisa se tiver algum problema?
    bjs


  13. Uma excelente interpretação moderna de um clássico, é engraçado como o clássico sobre a devastação do homem e da natureza serve como partida para toda a degradação do ambiente que fica registada na literatura, tal e qual como anéis numa árvore. Os perigos do aquecimento global estão no nosso espírito. Nós sabemos, nós sabemos. Podemos mentir mas não podemos fugir.

  14. cris s Says:

    Ludovico M. Alves,
    Obrigada!! Você tem toda razão, a literatura captura e registra tudo, por isso mesmo ela é excelente veículo para entendermos o mundo.
    Eu cliquei no teu nome e não consegui entrar no teu blog. Preciso me registrar? Fiquei curiosa!
    Tudo de bom para você e apareça quando quiser.
    Cris S.


  15. […] em  Uma verdade invonveniente.  Uma pequena contribuição minha pode ser lida nesse post aqui. É o post que recebe mais visitas no meu blog e fico muito feliz por […]

  16. ELISVANA Says:

    gostei muito do texto


  17. […] gente. Por outro lado, gostaria de registrar a minha satisfação em saber que o meu post “A terra devastada”: o impacto do aquecimento global na literatura recebe cerca de vinte visitas por dia. Discutir o meio ambiente por intermédio da literatura não […]

  18. gabriela Says:

    eu quero sabir qual e a relação entre a etica e o aquecimento global

  19. daniela tenorio Says:

    adorei sua iniciativa!! quando puder mande e mail p mim falando sobre esse assunto.

  20. felipe Says:

    Onde o mundo vai parar…a metade do nosso planeta terra se foi…e a turma msm sabendo do que pode acontecer daki pra frente,ainda tão poluindo,devastandu e etc…
    Será que eles querem morrer?…
    Ja praticamente ja estamos sem flora,fauna e sem agua….
    O que as pessoas pesam sobre a agua?…
    Eles acham que agua naum acaba tão muito enganado….Pois ela ja esta indu embora…

    O QUE VC FARIA PARA CONCIENTIZAR AS PESSOAS PARA QUE NAUM PERDECE O NOSSO PLANETA TERRA?

  21. Kboing Says:

    Que texto horrível!
    Além de não informar nada,é muito grande.

  22. cris s Says:

    Kboing,

    Deve ser muito longo, de fato, para pessoas como você. Exercite a leitura e seu senso crítico, no lugar da má educação que você demonstrou aqui.

    Cris S.

  23. kaio Says:

    que merda lasquen-se todos

  24. vania Says:

    o ki pode salvar o planeta é o homen se concientisar.


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